25/04/25 por Caroline Adorno em Artigos

A Dedutibilidade das Despesas na Tentativa de Financiamento Rural: Análise da Solução de Consulta COSIT nº 5/2025 à Luz da Lei nº 8.023/90

A Dedutibilidade das Despesas na Tentativa de Financiamento Rural: Análise da Solução de Consulta COSIT nº 5/2025 à Luz da Lei nº 8.023/90 A Dedutibilidade das Despesas na Tentativa de Financiamento Rural: Análise da Solução de Consulta COSIT nº 5/2025 à Luz da Lei nº 8.023/90 - Icon

O acesso ao crédito é, para o produtor rural, elemento estruturante de sua atividade econômica. A obtenção de financiamentos é indispensável tanto para o custeio da produção quanto para investimentos em maquinário, infraestrutura e insumos. Nesse contexto, é comum que, na tentativa de contratação de linhas de crédito junto a instituições financeiras, sejam exigidos estudos técnicos, vistorias, pareceres e outras providências que geram custos significativos — muitas vezes arcados mesmo quando o financiamento não se concretiza.


A natureza dessas despesas, e especialmente sua possibilidade de dedução na apuração do resultado da atividade rural por pessoas físicas, foi objeto da Solução de Consulta COSIT nº 5, de 2025, recentemente publicada pela Receita Federal do Brasil. O entendimento veiculado no documento, contudo, suscita relevantes reflexões jurídicas.


O Entendimento da Receita Federal na Solução COSIT 5/2025.


Na consulta formulada, um produtor rural pessoa física questionou a possibilidade de deduzir, da base de cálculo do resultado da atividade rural, despesas incorridas em razão de procedimentos necessários à tentativa de obtenção de financiamento, ainda que este não tenha sido aprovado.


A Receita Federal respondeu negativamente, afirmando que tais despesas somente serão consideradas dedutíveis se houver a efetiva concessão do crédito, sob o argumento de que, na ausência do financiamento, os gastos não estariam diretamente relacionados à percepção de receitas ou à manutenção da fonte produtora. Esse raciocínio busca uma vinculação imediata entre o desembolso e o ingresso de receita ou continuidade da atividade.


A Dedutibilidade sob a Ótica Legal: A Interpretação do Art. 4º da Lei nº 8.023/90.


A legislação aplicável ao tema encontra-se no art. 4º da Lei nº 8.023/90, que regula a apuração do resultado da atividade rural pelo contribuinte pessoa física. O dispositivo legal determina que:


"Art. 4º - O resultado da atividade rural será determinado com base na diferença entre o total das receitas recebidas e o total das despesas pagas, obedecidas as normas previstas nesta Lei."


A redação é clara ao considerar dedutíveis todas as despesas necessárias à obtenção de receitas ou à manutenção da atividade produtiva, independentemente de estas estarem condicionadas a um resultado positivo, como a aprovação de crédito.
Neste sentido, os gastos realizados para viabilizar o financiamento rural, mesmo que frustrado, integram o ciclo produtivo da atividade agrícola e deveriam, portanto, ser reconhecidos como despesas essenciais e legítimas para fins de apuração do resultado tributável.


O Papel do Financiamento no Ciclo Produtivo Rural.


Ao contrário de outras atividades empresariais, a produção rural apresenta características peculiares, como sazonalidade, riscos climáticos, variação cambial de insumos e dependência de capital de giro. O crédito rural, nesse contexto, não é uma alternativa pontual, mas um instrumento estrutural da produção agropecuária brasileira.
Assim, despesas relacionadas à tentativa de contratação de crédito não podem ser vistas como acessórias ou contingentes: elas constituem investimentos operacionais típicos, que integram o planejamento e a gestão da produção. Desconsiderar essa realidade implica desalinhar a interpretação fiscal da norma com a materialidade da atividade rural.


Considerações Finais.


Diante do entendimento oficial firmado pela Receita Federal na Solução de Consulta COSIT nº 5/2025, os produtores rurais devem redobrar a cautela ao realizar despesas vinculadas à tentativa de captação de crédito, cientes de que, à luz da interpretação atualmente vigente, tais gastos somente serão considerados dedutíveis se o financiamento for efetivamente liberado.


Embora se reconheça a coerência sistêmica buscada pela Receita Federal, o posicionamento suscita debate sobre a necessidade de uma abordagem mais sensível às especificidades da atividade rural.


A interpretação atualmente consolidada impõe ao produtor rural um ônus fiscal desproporcional, ao desconsiderar despesas que, embora não resultem em captação efetiva de crédito, são inerentes ao planejamento e à dinâmica financeira da atividade. Tal posicionamento acentua a necessidade de reflexão crítica sobre a adequação da norma infralegal à realidade setorial. Eventuais ajustes normativos ou orientações complementares poderiam contribuir para a harmonização entre a prática fiscal e a lógica econômica que sustenta o ciclo produtivo rural.

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