Testamento Vital: Um Instrumento de Autonomia e Planejamento em Decisões de Saúde
O testamento vital representa um avanço significativo no exercício da autonomia individual, oferecendo uma forma concreta de planejamento e respeito à dignidade em momentos de vulnerabilidade
O testamento vital, também denominado diretivas antecipadas de vontade (DAV), constitui-se como um instrumento jurídico que confere ao indivíduo a possibilidade de documentar suas preferências quanto a tratamentos de saúde, definindo quais procedimentos deseja ou recusa receber em situações futuras de incapacidade de manifestação de vontade. Neste contexto, as diretivas surgem como uma expressão concreta do princípio da autonomia privada e tem como objetivo assegurar que os desejos do paciente sejam respeitados, preservando sua dignidade. Importante destacar que o testamento vital difere do testamento convencional, que é aberto apenas após a morte do testador, enquanto o testamento vital é aplicado durante a vida.
Relevância e Benefícios do Testamento Vital
O testamento vital é uma expressão concreta do princípio da dignidade da pessoa humana, garantido pelo artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal. Ele permite que o indivíduo mantenha controle sobre as decisões relativas à sua própria vida, mesmo em situações de incapacidade. Além disso, promove uma comunicação mais eficaz entre pacientes, familiares e profissionais de saúde, reduzindo conflitos e incertezas no momento do cuidado.
Esse documento é particularmente relevante em casos de doenças terminais, condições irreversíveis ou estados de inconsciência, nos quais o paciente não pode tomar decisões diretamente. Ele oferece segurança e tranquilidade tanto para o paciente quanto para seus familiares, assegurando que as vontades expressas sejam respeitadas. A doação de órgãos, por exemplo, pode ser formalizada por meio do testamento vital, reforçando o respeito às convicções individuais.
Durante a pandemia de COVID-19, houve um aumento significativo na formalização de testamentos vitais no Brasil. No primeiro semestre de 2021, foram registrados 359 testamentos vitais, representando um crescimento de 65% em relação aos 217 registrados no mesmo período de 2020, conforme dados levantados pelo Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal.Esse aumento reflete uma maior conscientização sobre a importância de documentar antecipadamente as preferências relativas a tratamentos médicos em situações de incapacidade. A pandemia intensificou discussões sobre o tema, levando mais pessoas a formalizarem suas diretivas antecipadas de vontade.
Aspectos Legais do Testamento Vital no Brasil
Embora o testamento vital ainda não esteja regulamentado por legislação específica no Brasil, sua validade encontra respaldo em princípios constitucionais e normativos, como no Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, previsto no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, que assegura que toda pessoa tem o direito de ser tratada com dignidade, o que inclui a possibilidade de determinar como deseja ser cuidada em situações de vulnerabilidade; no Direito à Autonomia, estabelecido no artigo 15 do Código Civil, que garante ao indivíduo o direito de recusar tratamentos médicos, respeitando sua liberdade de escolha; e na Resolução nº 1.995/2012 do Conselho Federal de Medicina (CFM), que orienta que os profissionais de saúde respeitem as diretivas antecipadas de vontade, desde que estas não contrariem normas éticas ou legais.
Essas disposições reforçam o direito do paciente de tomar decisões informadas e autônomas sobre seu cuidado médico, mesmo quando estiver incapacitado para expressá-las diretamente.
Nesse ínterim, o documento pode conter informações como os tratamentos desejados ou recusados, indicar a preferência por cuidados paliativos, e nomear procuradores de confiança para garantir a execução das diretivas.
Embora não seja obrigatório, recomenda-se que o documento seja registrado em cartório, em escritura pública, conferindo maior segurança jurídica. Isso facilita o reconhecimento de sua validade e evita questionamentos futuros. Também é importante ressaltar que o testamento vital pode ser alterado ou revogado a qualquer momento, desde que o paciente esteja em pleno gozo de sua capacidade.
Divulgação e Garantia de Cumprimento
Para garantir que o testamento vital seja respeitado, é fundamental que as pessoas envolvidas tenham conhecimento de sua existência. Algumas medidas que podem ser tomadas incluem a comunicação com familiares e representantes, com o objetivo de informar parentes próximos e os procuradores designados sobre o teor do documento, bem como providenciar o registro junto a médicos e hospitais, entregando uma cópia do testamento vital aos profissionais e instituições de saúde para que conste no prontuário médico.
Caso o testamento vital não seja respeitado, é possível buscar sua execução perante o judiciário. Essa medida visa assegurar que as vontades previamente manifestadas pelo paciente sejam devidamente cumpridas, preservando a sua autonomia.
Conclusão
O testamento vital representa um avanço significativo no exercício da autonomia individual, oferecendo uma forma concreta de planejamento e respeito à dignidade em momentos de vulnerabilidade. Apesar da ausência de legislação específica, seu uso tem sido amplamente aceito, respaldado por princípios éticos e jurídicos. A elaboração detalhada, o registro adequado e a divulgação entre os envolvidos são fundamentais para assegurar sua eficácia.
Assim, o testamento vital consolida-se como um instrumento essencial para garantir que as escolhas individuais sejam respeitadas.