Doações e heranças do exterior não devem pagar imposto: o que diz a legislação brasileira?

A tributação sobre doações e heranças é um tema recorrente no Direito Tributário brasileiro, especialmente quando envolve elementos de conexão com o exterior. O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), de competência estadual, incide sobre a transferência de bens ou direitos por sucessão ou doação. No entanto, sua cobrança enfrenta um impasse jurídico quando a operação envolve doador ou falecido domiciliado no exterior.
Essa controvérsia se arrasta há anos, mas teve um desfecho relevante em março de 2021, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional a exigência do ITCMD nesses casos sem uma lei complementar que regulamente a matéria.
A decisão do STF e seus impactos
O entendimento do STF foi consolidado no julgamento do Recurso Extraordinário nº 851.108, com repercussão geral, ou seja, vinculante para todos os tribunais do país. A Corte reconheceu que, nos casos em que o doador ou o falecido tem domicílio no exterior ou quando os bens estão localizados fora do Brasil, os estados não podem cobrar o ITCMD sem que exista uma lei complementar federal regulamentando a questão.
Isso ocorre porque a Constituição Federal, no artigo 155, § 1º, inciso III, exige a criação de uma lei complementar para que os estados e o Distrito Federal possam instituir o imposto nesses casos. Até o momento, essa lei ainda não foi editada, tornando inconstitucional qualquer tentativa de cobrança por parte das autoridades fiscais estaduais.
O que isso significa na prática?
Na ausência dessa regulamentação, os contribuintes não são obrigados a pagar o ITCMD quando:
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O doador reside ou tem domicílio no exterior;
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O falecido possuía bens, residência ou domicílio no exterior;
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O inventário foi realizado no exterior.
Mesmo assim, diversos estados continuam a exigir o pagamento do imposto, contrariando a decisão do STF. Isso tem levado muitos contribuintes a buscar medidas judiciais para evitar ou reverter a cobrança indevida.
A necessidade de questionamento judicial
Diante da insistência dos estados em cobrar o ITCMD em situações que envolvem bens ou doadores no exterior, muitos beneficiários têm recorrido ao mandado de segurança preventivo. Essa medida judicial permite afastar a cobrança indevida antes que o imposto seja exigido, garantindo segurança jurídica ao contribuinte.
Além disso, quem já recolheu o ITCMD indevidamente nos últimos cinco anos pode solicitar a restituição dos valores pagos, utilizando os mesmos fundamentos jurídicos.
Justiça fiscal e planejamento tributário
O reconhecimento da imunidade do ITCMD em doações e heranças com conexão no exterior não representa um benefício indevido ou uma forma de sonegação, mas sim o cumprimento da Constituição Federal e da decisão do STF. Para quem recebe esse tipo de transferência patrimonial, a medida traz segurança jurídica e evita despesas desnecessárias.
Embora o cenário atual favoreça os contribuintes, é essencial um planejamento tributário adequado para evitar questionamentos futuros e assegurar que todas as etapas da sucessão ou da doação ocorram dentro da legalidade.
Com o avanço dos investimentos internacionais e a globalização das relações patrimoniais, a correta interpretação das regras tributárias se torna cada vez mais relevante, garantindo que o contribuinte possa exercer seus direitos sem o risco de cobranças inconstitucionais.